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Chapter 21 - Capítulo 20 – O Reino Selvagem

O amanhecer tingia o céu com tons de ouro e violeta. A brisa fria do norte atravessava os campos ao redor de Arandel, trazendo consigo o perfume do orvalho e o eco distante das badaladas dos sinos da cidade. As ruas de pedra despertavam lentamente — comerciantes abrindo portas, ferreiros reacendendo fornos, e o murmúrio do rio correndo sob as pontes de madeira.

Diante do portão leste, três figuras aguardavam em silêncio.

Lucius estava à frente, o manto negro da Guilda Caelum balançando suavemente ao vento. No peito, o emblema dourado cintilava com a luz do sol nascente — uma espada erguida ao centro, cercada por sete símbolos elementares dispostos em círculo: fogo, água, terra, vento, relâmpago, luz e trevas. Abaixo, o nome "Caelum" estava gravado em letras firmes e elegantes, símbolo de união e propósito.Era mais que um brasão. Era uma lembrança de tudo que haviam construído juntos.

Ao seu lado, Friaren observava o horizonte com olhos vivos e curiosos. O cabelo dourado refletia o brilho do amanhecer, e o leve sorriso em seus lábios revelava uma mistura de expectativa e impaciência. Ela não precisava do vento para se erguer — a gravidade parecia não ter domínio sobre ela. Flutuava a poucos centímetros do chão, serena e livre, como se o ar fosse parte de sua essência.

Atrás deles, Aurus — o lobo místico — se erguia em toda sua majestade. O corpo prateado reluzia como aço vivo, e o olhar dourado refletia uma inteligência antiga. Seu tamanho havia diminuído para caber no portão, mas ainda assim cada passo fazia o solo vibrar levemente. A aura dele oscilava entre calma e destruição — o equilíbrio de uma besta mítica que havia tocado o nível santo.

"Cinco anos..." murmurou Lucius, com um tom tranquilo, o olhar perdido na estrada que serpenteava pelos campos em direção às montanhas distantes. "Cinco anos desde que fundamos a guilda. E, mesmo assim, parece que foi ontem."

Friaren riu, cruzando os braços. "Cinco anos e você já fala como um velho sábio. Vai ver é o peso da seriedade precoce."

Lucius ergueu uma sobrancelha. "Ou talvez seja o peso de lidar com uma maga que acha que relâmpagos substituem bom senso."

"Ei!" Friaren fingiu indignação. "Relâmpagos são apenas pensamentos rápidos demais pra se conter. Eu sou um gênio impaciente, é diferente."

Aurus soltou um som grave e ritmado — algo entre um rosnado e uma risada."Vocês dois ainda discutem como antes. O tempo passa, mas os trovões e as sombras continuam os mesmos."

Lucius sorriu de canto. "E você continua ouvindo demais, lobo velho."

"Lobo sábio," corrigiu Aurus com falsa pompa. "Ou prefere 'besta lendária com melhor senso de humor que humanos'?"

Friaren gargalhou, e o som ecoou leve pela estrada. "Eu voto na segunda opção."

Enquanto isso, os moradores da cidade observavam à distância, cochichando entre si.Eram apenas três viajantes partindo — ou, para a maioria, três jovens da Guilda Caelum em busca de aventuras.

"São eles... os prodígios da guilda," murmurou um ferreiro. "Mas dizem que quem comanda mesmo são Lyara, Kael e Rogan."

"Esses jovens são só aprendizes com sorte," comentou outro. "Deve ser viagem de treinamento. A guilda é poderosa, mas eles ainda têm muito a aprender."

Lucius ouviu os murmúrios, mas não se importou. Havia uma certa paz em ser subestimado.A ignorância, às vezes, era a melhor das proteções.

Friaren, por outro lado, sorriu de canto. "Ouviu isso? 'Aprendizes com sorte'. Se eu quiser, chamo um trovão só pra assustar o barbeiro fofoqueiro da esquina."

Lucius a fitou de lado. "E perder o prazer de vê-los continuar acreditando nisso? Deixe-os pensar o que quiserem."

Ela cruzou os braços, bufando. "Você e essa mania de paciência."

"Chama-se sabedoria."

"Eu prefiro 'tédio'."

Aurus interrompeu, a voz profunda ressoando como um eco dentro do peito dos dois. "Vocês dois parecem esquecer que estamos indo à Cordilheira das Bestas Mágicas. Discussões sobre tédio podem esperar."

Friaren suspirou teatralmente. "Está bem, está bem. O sábio tem razão. Vamos antes que o vento mude de humor."

Lucius assentiu. "A Cordilheira nos espera."

O lobo aumentou levemente de tamanho, permitindo que Lucius subisse em suas costas. Friaren flutuou ao lado, a luz do amanhecer refletindo em seus cabelos, e juntos, começaram a avançar pela estrada de pedra.

Atrás deles, os portões de Arandel se fecharam lentamente.O som ecoou como um marco — o fim de um ciclo, o início de outro.

A estrada se estendia diante deles, longa e viva.O mundo os chamava — não com promessas de glória, mas com a simples e poderosa vontade de viver, aprender e entender o que existia além do conhecido.

O vento soprou.E o trio da Guilda Caelum partiu, em direção à vastidão da Cordilheira das Bestas Mágicas.

...

A estrada se alargava à medida que o trio deixava os portões de Arandel para trás.O sol já subia alto, derramando luz dourada sobre os campos ondulantes e colinas cobertas por flores silvestres. O vento trazia o murmúrio das folhas e o perfume do capim cortado. Por um instante, o mundo parecia simples — como se cada respiração fosse uma canção que o tempo havia esquecido de silenciar.

Lucius caminhava à frente, passos firmes e olhos atentos.Friaren o acompanhava logo ao lado, sem o mesmo ar distraído de antigamente.Havia nela uma serenidade nova — algo amadurecido, quase doce. A antiga maga impaciente e distante, que via o mundo como um conjunto de enigmas a serem resolvidos por relâmpagos, agora observava as coisas pequenas: o brilho do orvalho nas folhas, o som dos insetos, o rastro da luz no ar.

Lucius notou isso em silêncio."Você está diferente," comentou, depois de alguns minutos caminhando. "Mais calma. O que aconteceu com a Friaren que dizia que parar pra ver o pôr do sol era perda de tempo?"

Ela sorriu, olhando para o horizonte. "Ela levou um raio na cabeça e entendeu que nem tudo precisa ser rápido."Depois completou, com um olhar brincalhão: "Mas só um pouco. Eu ainda sou eu."

Lucius riu baixo. "Ainda bem. Seria estranho viajar com alguém sensata."

"Ah, então admitiu que eu era louca?"

"Eu prefiro o termo... imprevisível."

Friaren cruzou os braços, fingindo ofensa. "Imprevisível é um elogio aceitável."

Atrás deles, Aurus caminhava com passos pesados, mas havia um brilho sereno em seus olhos dourados. O ar da natureza parecia reviver algo antigo dentro dele — uma lembrança adormecida. Ele inspirou fundo, deixando o vento correr entre os pelos prateados.

"Há quanto tempo não sentia isso..." murmurou, com voz grave, quase como um rugido abafado. "O cheiro da terra viva. Do vento que não foi domado por muros."

Friaren o olhou, curiosa. "Você parece... feliz. Nostálgico até."

"É mais que isso," respondeu Aurus, sem desviar os olhos da linha de árvores que surgia à frente. "Foi perto daqui que nasci. Nas margens da Floresta Negra, ao sul da Cordilheira. Mas lá... não havia lugar para alegria."

Lucius manteve o olhar fixo no caminho. "A Floresta Negra... já ouvi histórias sobre ela. Dizem que até as sombras têm dentes."

"Não é mentira," respondeu o lobo. "Aquele lugar é puro instinto. Sobrevivência. Havia um enxame de roedores selvagens — chamávamos de os Ratos de Ossos. Vinham em ondas, devoravam tudo. Até os próprios feridos. Uma vez, eu vi uma alcateia inteira ser engolida em uma única noite."

Friaren franziu o cenho, o tom de leveza desaparecendo. "E você... sobreviveu?"

Aurus assentiu. "Eu fugi. Ainda era um filhote, mas já sabia o que era o medo.Foi ali que aprendi o que é ser caçador — e o que é ser caça."

O silêncio se espalhou por alguns instantes. O som do vento voltou a dominar, trazendo o aroma úmido das árvores que se aproximavam.A fronteira da floresta se erguia diante deles — alta, densa e viva, com copas que se entrelaçavam, escondendo o céu. O ar ali era mais frio, pesado. A luz do sol se filtrava em feixes dourados e verdes, pintando o chão com sombras móveis.

Friaren respirou fundo. "Bom... se há monstros lá dentro, ao menos o cenário é bonito."

Lucius sorriu de leve. "Essa é uma forma otimista de encarar o perigo."

"Eu evoluí," ela respondeu, piscando para ele. "Agora enfrento o perigo com estilo."

Aurus avançou primeiro, rompendo as folhagens com facilidade. Lucius e Friaren o seguiram, atentos ao ambiente.Mas assim que deram poucos passos sob as copas das árvores, o som do mundo mudou. O canto dos pássaros cessou. O vento pareceu prender a respiração.

Lucius parou."Estão sentindo isso?"

Friaren assentiu. "Silêncio demais."

Foi então que ouviram o estalo de um galho. Depois outro.Som vindo da direita... e da esquerda.Som de passos leves, coordenados.

Da penumbra entre as árvores, sombras começaram a se mover.Homens de roupas gastas e olhos famintos, portando lanças, adagas e arcos.Bandidos.

Um deles surgiu à frente, sorrindo com dentes quebrados. "Ora, ora... o que temos aqui? Crianças perdidas e um lobo de estimação?"

Lucius manteve a calma. "E vocês são?"

"O comitê de boas-vindas da floresta," respondeu o homem, enquanto outros se espalhavam em volta, formando um círculo. "A gente cuida de viajantes como vocês. Pega o que é pesado pra carregar... e deixa o resto ir embora."

Friaren arqueou uma sobrancelha. "Que gentileza. Quer dizer que vocês também são altruístas?"

O bandido riu. "A gente é o que precisa ser pra sobreviver."

Lucius deu um passo à frente. "Então talvez hoje seja o dia em que vocês aprendam o que acontece quando escolhem a caça errada."

O homem gargalhou, mas o som morreu rápido.Os olhos dele encontraram os de Lucius — e, por um instante, o ar pareceu endurecer.Era como encarar um abismo que olhava de volta.

Friaren abriu um sorriso calmo, erguendo uma das mãos. Faíscas douradas começaram a correr entre seus dedos, dançando no ar como serpentes vivas.Aurus soltou um rugido baixo, e sua forma começou a crescer, os pelos prateados se eriçando enquanto a floresta tremia ao seu redor.

O líder dos bandidos deu um passo para trás, o sorriso desaparecendo."E-espera aí... vocês não são—"

Friaren o interrompeu, com o tom doce e letal de quem já decidiu o destino de alguém."Não somos quem você esperava, querido."

O ar vibrou.E o primeiro trovão ecoou na floresta.

...

O cheiro de ferro e fumaça se misturava ao ar úmido da floresta.O chão estava coberto por galhos partidos e marcas de queimadura. As folhas ainda tremiam com o eco distante de um trovão. O ataque dos bandidos durara pouco — rápido demais para deixar memória, longo o suficiente para marcar o silêncio que veio depois.

Lucius observava em silêncio o rastro deixado pela luta.Não havia orgulho em seus olhos, apenas calma. Ele sabia que a violência, por mais inevitável que fosse, sempre cobrava algo — mesmo de quem a vencia.Ao lado dele, Friaren limpava a poeira das luvas, os cabelos prateados ainda faiscando com leves resquícios de energia. Aurus, agora em forma menor, farejava o ar com atenção, mas logo relaxou o corpo.

"Acabou," disse o lobo, com um leve suspiro. "Esses homens não eram monstros... só tolos famintos. A floresta tem o dom de transformar desespero em crueldade."

Lucius assentiu, olhando para as árvores. "Nem todos nascem com escolha. Mas a escolha de atacar... essa sempre existe."

Friaren ficou em silêncio por um instante. O brilho de relâmpago que dançava em seus olhos desapareceu aos poucos, substituído por algo mais suave.Ela olhou para Lucius, e por um momento, parecia diferente da guerreira que atravessara metade do império ao lado dele."Você fala como alguém que já viu demais para a idade que tem," disse ela, com um meio sorriso.

"E você, como alguém que aprendeu a rir da própria dor."

Ela arqueou uma sobrancelha. "Essa foi profunda."

"É o costume," respondeu ele, com leve ironia. "Você era diferente... lembra? Quando nos conhecemos, era fria, distante. Quase parecia que nada te tocava."

Friaren desviou o olhar, observando uma borboleta pousar em uma folha próxima."Talvez fosse isso mesmo. Naquela época, eu achava que sentimentos atrapalhavam. Que se eu me envolvesse demais, seria fraca. Então, eu me fechei. Fiz do silêncio um escudo."

"E agora?" perguntou Lucius, com tom sereno.

Ela respirou fundo, olhando o céu através das copas."Agora eu entendo que o silêncio não protege... apenas isola.Ver todos nós crescer — você, Lyara, as gêmeas, até aquele teimoso do Kael — fez eu perceber que... sentir não é fraqueza. É parte do que nos torna vivos."

Lucius manteve o olhar fixo nela, e por um breve instante, o ar pareceu mais leve."Você mudou, Friaren."

"Eu aprendi com você," respondeu ela, sorrindo de leve. "Com sua teimosia, sua calma irritante, e essa mania de carregar o peso do mundo nos ombros."

"Eu não carrego o mundo," disse ele, olhando para o horizonte. "Apenas sigo em frente. O mundo é que insiste em vir junto."

Friaren riu baixo — um som raro, genuíno, que o vento pareceu guardar com cuidado."Talvez seja por isso que as pessoas te seguem. Mesmo sem entender, elas sentem algo em você... algo que as faz acreditar."

Lucius se virou para ela, o olhar tranquilo."E você acredita?"

Ela hesitou por um instante, depois respondeu:"Eu acredito em quem continua caminhando, mesmo quando o caminho desaparece."

O vento soprou, e as folhas caíram ao redor deles, girando no ar como ecos de memórias antigas.Aurus, observando a cena, deixou escapar um leve rosnado divertido."Vocês humanos... sempre transformando silêncio em poesia."

Friaren olhou para ele. "E você, sempre transformando poesia em tédio."

"É um talento natural," respondeu o lobo, fingindo orgulho.

Lucius balançou a cabeça, sorrindo. "Vamos seguir. Ainda há muito da floresta pela frente."

Eles retomaram o caminho, o som dos passos misturando-se ao murmúrio distante da mata.A cada passo, Friaren parecia mais leve.Não era apenas uma maga santa — era uma mulher que aprendera a se permitir sentir, a rir, e a caminhar ao lado de alguém sem medo de ficar para trás.

Lucius notou, em silêncio, e pela primeira vez em muito tempo, permitiu-se apenas caminhar.Sem pressa.Sem planos.Apenas com a sensação de que, talvez, aquele fosse o verdadeiro começo de uma nova jornada — não de poder, mas de humanidade.

...

A floresta parecia respirar.Cada folha, cada pedra, cada sopro do vento carregava uma presença viva — um ritmo que pulsava sob o chão e se espalhava pelo ar como um coração antigo batendo no centro do mundo.

Lucius andava à frente, a capa escura roçando na relva úmida. O sol se filtrava entre as copas altas, derramando feixes dourados que dançavam no ar como fios de luz sólida.Friaren flutuava levemente a poucos passos atrás, o corpo envolto por uma brisa suave. Seus cabelos prateados se moviam junto ao vento, refletindo as cores do céu.Aurus, em tamanho reduzido, caminhava entre eles — o pelo negro reluzindo sob o sol, os olhos dourados atentos a cada som.

A Cordilheira das Bestas Mágicas se estendia diante deles como um oceano verde e vivo. Montanhas cobertas de musgo e névoa, rios que cortavam vales como lâminas líquidas, e o eco distante de criaturas que rugiam nas alturas.Era um mundo intocado, selvagem e sagrado — o tipo de lugar onde os fracos não sobreviviam, mas onde o forte aprendia a respeitar.

"É estranho," murmurou Friaren, olhando para o horizonte. "Sempre ouvi histórias sobre a cordilheira… sobre as feras que devoram até magos santos. Mas aqui… é tão bonito que chega a parecer um sonho."

"É um sonho," respondeu Lucius, observando um grupo de pássaros de penas cristalinas voando sobre um lago. "Só que os sonhos também mordem, se você os provocar."

Aurus soltou um som baixo, semelhante a uma risada."Isso é verdade. Quando eu era pequeno, costumava caçar perto da fronteira da Floresta Negra. Lá, não havia paz — só luta e instinto. Aqui é diferente… há ordem dentro do caos. As feras caçam, sim, mas também protegem. É como se toda a cordilheira tivesse vontade própria."

Enquanto caminhavam, o cenário se transformava.O verde denso da mata cedia lugar a clareiras cobertas por flores luminescentes.Lagos espelhados refletiam o céu e as montanhas, e nas margens, criaturas de formas estranhas bebiam água — cervos com chifres de cristal, raposas de duas caudas, e serpentes aladas que se enrolavam em troncos de árvores antigas.

Friaren observava tudo com olhos brilhantes."Quando eu era criança, achava que o mundo era só dor e luta… Mas aqui, tudo parece vivo, mesmo o que parece perigoso. É... bonito demais."

Lucius se aproximou de uma flor grande, com pétalas que pulsavam como se respirassem."Bonito, mas não inofensivo. Tudo aqui tem propósito. Até as flores caçam — essa aí dissolve insetos com névoa ácida."

Ela recuou de leve, arregalando os olhos. "Você podia ter avisado antes!"

Ele sorriu, com calma. "Mas onde estaria a graça?"

Aurus inclinou a cabeça, divertido. "Vocês dois têm um dom para estragar o silêncio da floresta."

"Alguém tem que manter o clima leve," respondeu Friaren, cruzando os braços. "Ou você quer que a gente ande em silêncio igual estátua?"

Lucius deu uma risada baixa — um som raro."Silêncio é útil quando o mundo te escuta. Mas hoje... acho que ele só está nos observando."

Eles seguiram por um caminho estreito, ladeado por raízes que se entrelaçavam como muralhas naturais.O som da água correndo em algum ponto próximo os guiou até uma cascata.A luz atravessava o véu líquido, criando reflexos que dançavam sobre as pedras.Friaren, encantada, estendeu a mão — pequenas faíscas de relâmpago correram entre seus dedos e se misturaram com o brilho da queda d'água, como se relâmpago e chuva fossem um só elemento.

Lucius parou ao lado dela, olhando a cena."Mesmo com todo poder que temos, a natureza ainda é mais bela quando não tenta impressionar."

Ela sorriu, virando o rosto. "É por isso que você raramente fala sobre o que sente, não é? Tem medo de ser simples."

"Talvez," respondeu ele, após uma pausa. "Ou talvez eu só tenha aprendido que o silêncio também fala — quando se sabe escutar."

Aurus observava de perto uma criatura que parecia uma mistura de lobo e coruja, pousada sobre uma pedra. Ela o encarou por alguns segundos antes de desaparecer como névoa."Mesmo eu, que nasci entre bestas, nunca vi tanta diversidade em um só lugar," murmurou ele. "Se o mundo tivesse uma alma, ela moraria aqui."

O vento soprou de novo — fresco, cheio do perfume de musgo e flores.Lucius olhou o horizonte, onde as montanhas mais distantes tocavam o céu."Então é aqui que começamos. Não uma caçada. Não uma guerra. Apenas... caminhar. Conhecer o mundo como ele é."

Friaren assentiu. "E se o mundo não gostar da gente?"

Lucius sorriu. "Aí ele que aprenda a se acostumar."

Aurus soltou um rugido baixo, satisfeito, e seguiu à frente — a cauda balançando, os olhos atentos.O trio avançou em meio ao som de pássaros distantes e folhas dançando ao vento.Acima, o sol já começava a descer, tingindo o céu com tons de ouro e violeta.

E assim, sob a luz do entardecer, eles entraram mais fundo na Cordilheira das Bestas Mágicas — não como guerreiros, mas como viajantes em busca de algo que não podia ser ensinado:a compreensão do próprio mundo.

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